outubro 31, 2021

um corpo

um corpo desviante, desviado
desViado
um corpo em fuga, nômade eterno de si
um corpo-magma derretida, espraiada
um corpo-pedra calcificada
um corpo-ar quente e úmido
corpo-carne, vísceras, sangue
um corpo colonizado, desterritorializando-se
um corpo desviante, desviado, descrente
em fuga
um corpo-zombie, no limiar da vida e da morte
um corpo-luz, luminoso, veloz, infinito
a body, un cuerpo, um corpo.

[04 de outubro de 2021, 11:24 a.m.]

18 de julho de 2021

Eu sinto que passei uma boa parte da minha vida me escondendo de mim mesmo e dos outros, principalmente dos outros, dos olhares que nos arrancam do conforto da própria pele. Em parte, fiz isso pra esconder dos outros a sexualidade, o desejo, que tanto ardia em mim; que tanto me assombrava, como também implorava pra sair, pra romper com a pele enclausurante. A outra parte, se deu porque eu carrego em mim uma força estranha que me impele de me abrir às outras pessoas. Sou um ótimo ouvinte, mas quando sou eu quem falo, eu sinto que não devia ter falado, como se o meu mundo interno não fosse importante, não fosse digno. Eu tendo a me por abaixo do outro, a me diminuir, a não me gabar pelos meus méritos. Não gosto da sensação de que estou por cima de alguém ou que as pessoas pensem que estou fazendo isso. Acredito que muito disso tem a ver com a minha história com a igreja, com a culpa cristã, com o medo do inferno, com o enclausurar de mim mesmo. Eu leio os olhares das pessoas, sinto na pele o peso do julgamento, do nojo, da indiferença. E talvez seja por isso que eu fale tão pouco de mim, que eu pareça nada saber de mim. Quando me perguntam como eu estou, como anda a minha vida, eu respondo que não há nada de interessante porque no geral não há nada mesmo que interesse a elas. Quando estou na presença do outro, a vida do outro, as histórias do outro me interessam mais, por partir do pressuposto de que eu não tenho nada de interessante a dizer; interessa-me mais o que o outro tem a dizer. (Sempre que eu falo algo de mim, aquela força estranha me puxa pra baixo; sinto-me uma fraude, uma pessoa sem gosto). Do outro lado, eu acho que eu tenho um medo do outro acessar o meu lado de dentro. Não conheço todos os meus monstros e fantasmas. Mas pode ser que tudo isso seja obra do meu narciso, que no fundo-sem-fundo, eu queira ser o centro da atenção, seja qual for o caminho pra isso. Parte de mim é composta de insegurança, de medo da rejeição, medo da entrega; há um pedaço de mim que quer sentir-se digno (de ser amado, desejado); há um pedaço que procura fora o que só pode ser encontrado dentro; o silêncio me conforta. Há também uma parte que ama e odeia estar só. Mas eu também sei que em algum lugar de mim existe coisa boa, há ouro bruto, há diamante a ser lapidado, eu só preciso me descobrir mais, eu acho.